sábado, 28 de fevereiro de 2009

Acerca da Lei da Natureza e a Possibilidade do Conhecimento de Deus

Uma paráfrase em C.S. Lewis



Acerca do movimento do cosmos e nossa miserabilidade, pode-se dizer que essa lei que os rege e a lei ou regra do certo e do errado eram chamadas pelos filósofos de Lei Natural. Porém, quando os pensadores do passado chamavam a lei do certo e do errado de "Lei Natural", estava implícito que se tratava da Lei da Natureza Humana. A idéia era a seguinte: assim como os corpos são regidos pela lei da gravitação, e os organismos, pelas leis da biologia, assim também a criatura chamada "homem" possui uma lei própria - com a grande diferença de que os corpos não são livres para escolher se vão obedecer à lei da gravitação ou não, ao passo que o homem pode escolher entre obedecer ou desobedecer à Lei da Natureza Humana. Se alguém se der ao trabalho de comparar os ensinamentos morais dos antigos egípcios, dos babilônios, dos hindus, dos chineses, dos gregos e dos romanos, ficará surpreso, isto sim, com o imenso grau de semelhança que eles têm entre si e também com nossos próprios ensinamentos morais. Os homens conhecem a Lei Natural e transgridem-na. Algumas pessoas têm dificuldade para compreender o que significa essa Lei da Natureza Humana, ou Lei Moral, ou Regra de Bom Comportamento. A analogia é simples, a Lei Moral nos informa da melodia a ser tocada enquanto nossos instintos são meras teclas. Provavelmente, seu desejo de ficar a salvo é maior do que o desejo de ajudar o homem que se afoga, mas a Lei Moral lhe manda ajudá-lo, apesar dos pesares. Se um conjunto de idéias morais não fosse melhor do que outro, não haveria sentido em preferir a moral civilizada à moral bárbara, ou a moral cristã à moral nazista. Não há aqui uma diferença de princípios morais, apenas de enfoque dos fatos. Afinal de contas, aquilo que se chame de transgressão da Lei do Certo e do Errado, ou da Lei Natural, significa implicitamente somente que ninguém é perfeito. A lei da gravidade diz o que a pedra faz quando cai; já a Lei da Natureza Humana diz o que os seres humanos deveriam fazer e não fazem. Ou seja, quando se trata de seres humanos, existe algo além e acima dos fatos. No resto do universo, não há necessidade de outra coisa que não os fatos. Da mesma forma, se uma pessoa pergunta o motivo de se agir com decência, não vale a pena responder "para o bem da sociedade", pois tentar beneficiar a sociedade, ou, em outras palavras, ser altruísta, é um dos elementos da decência. A Lei Moral, ou Lei da Natureza Humana, não é simplesmente um fato a respeito do comportamento humano, como a Lei da Gravidade é ou pode ser simplesmente um fato a respeito do comportamento dos objetos pesados. Conseqüentemente, essa Regra do Certo e do Errado, ou Lei da Natureza Humana, ou como quer que se chame, é uma Verdade - uma coisa que existe realmente, e não uma invenção humana. No caso do homem, porém, percebe-se que as coisas não são bem assim. A Lei da Natureza Humana, ou Lei do Certo e do Errado, é algo que transcende os fatos do comportamento humano. Neste caso, além dos fatos em si, existe outra coisa - uma verdadeira lei que não foi inventada e à qual sabe-se que se deve obedecer. A natureza da questão é a seguinte: pretende-se saber se o universo simplesmente é o que é, sem nenhuma razão especial, ou se existe por trás dele um poder que o produziu tal como se conhece. Uma vez que esse poder, se ele existe, não seria um dos fatos observados, mas a realidade que os produziu, a mera observação dos fenômenos não pode encontrá-lo. Existe apenas um caso no qual é possível saber se esse "algo mais" existe; a saber, o caso de cada sujeito. E, nesse caso, constata-se que existe. Examine-se a questão de outro ângulo: se existisse um poder exterior que controlasse o universo, ele não poderia se revelar para o homem como um dos fatos do próprio universo - da mesma forma que o arquiteto de uma casa não pode ser uma de suas escadas, paredes ou lareira. A única maneira pela qual se espera que esta força se manifeste é dentro de cada sujeito, como uma influência ou voz de comando que o tente levar a adotar uma determinada conduta. E justamente isso que cada indivíduo tem descoberto dentro de si. Somente isto já não é motivo para ficar com a pulga atrás da orelha? No único caso em que se pode encontrar uma resposta, ela é positiva; nos outros, em que não há respostas, sabe-se por que não é possível encontrá-las. Suponha que alguém pergunte, acerca de um homem de uniforme amarelo e azul que passa de casa em casa depositando envelopes de papel em cada uma delas, por que, afinal, conclui-se que dentro dos envelopes existem cartas? Porque sempre que ele deixa envelopes parecidos em cada casa, dentro deles há uma carta para alguém. Se o leitor questionasse: Mas ninguém jamais viu as cartas que supõe que as outras pessoas recebam? Simples, imagina-se o conteúdo dos envelopes que não abertos pelos envelopes abertos por cada indivíduo. O mesmo se dá aqui. O único envelope possível de abrir é o Ser Humano. Especialmente, quando alguém abre um Ser Humano chamado "Eu", descobre-se ninguém existe por si mesmo, mas que vive-se sob uma lei, que algo ou alguém quer que o “Eu” se comporte de determinada forma. E é claro que se todos nós pudéssemos entrar na existência de uma pedra ou de uma árvore, encontraria exatamente a mesma coisa, assim como ninguém crê que seus vizinhos recebam exatamente as mesmas. Conclui-se, portanto, que a pedra, por exemplo, tem de obedecer à lei da gravidade - que, enquanto o remetente se limita a aconselhar a obediência à lei da minha natureza, ele obriga a pedra a obedecer às leis de sua natureza pétrea. O ninguém pode negar é que, em ambos os casos, existe, por assim dizer, esse remetente, um Poder por trás dos fatos, um Diretor, um Guia. Ainda nem estamos perto do Deus da teologia cristã. Tudo o que se obteve até aqui é a evidência de Algo que dirige o universo e que se manifesta no sujeito como uma lei que o incita a praticar o certo e fá-lo sentir-se incomodado e responsável pelos meus erros. Conforme parece, supõe-se que esse Algo é mais parecido com uma mente do que com qualquer outra coisa conhecida — porque, afinal de contas, a única outra coisa que se conhece é a matéria, e ninguém jamais viu um pedaço de matéria dar instruções a alguém. E claro, porém, que não precisa ser muito parecido com uma mente, muito menos com uma pessoa. Tentemos descobrir mais a seu respeito. Apenas uma advertência. Houve muita conversa fajuta a respeito de Deus nos últimos cem anos. É bom que se esqueça de tudo que ouviu.

Fonte: LEWIS, C. S. Cristianismo puro e simples. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Alternativas Éticas: Cristãs?


Norman Geisler


O estudo da ética cristã no Brasil difundiu-se basicamente sob a abordagem de Norman Geisler em seu título Ética Cristã: alternativas éticas e questões contemporâneas.

A exposição teórica introduz-se com a narração do impasse entre o governo norte-coreanos e o comandante Lloyd Bucher que é obrigado a mentir para que sua tripulação fosse salva. Utilizando este evento como um laboratório de ética cristã, sugere-se seis alternativas éticas.

A primeira alternativa exposta é o antinominismo que assevera: não há normas. A segunda exposição é a do generalismo, para o qual não há normas universais, ou seja, há normas gerais utilitárias que normalmente não deveriam ser quebradas. A terceira exposição trata do situacionismo que reclama: há uma norma universal, o amor. Em oposição ao situacionismo está a quarta explicação: o absolutismo não-conflitante ao dizer que há muitas normas universais não-conflitantes. Aliada a esta, a quinta alternativa ética: absolutismo ideal que diz, há muitas normas universais conflitantes. E, finalmente, o hierarquismo, posição defendida e assumida pelo autor, prescreve: Há normas universais hierarquicamente ordenadas.

Segundo a exposição de Geisler, o problema do comandante Bucher pode ter os seguintes desfechos: conforme o antinominismo, o comandante pôde mentir porque mentir não é certo nem errado, pois que não há normas; conforme o generalismo, ele pôde porque mentir é geralmente errado, mas deve-se ter em vista um bem maior, útil; é um fim útil salvar pessoas; de acordo com o situacionismo, ele pôde porque mentir às vezes é certo quando o amor direciona a resolução do conflito. Porém, no absolutismo não conflitante, ele jamais poderia ter mentido porque mentir é errado e as normas não são conflitantes. Também no absolutismo ideal, o comandante jamais poderia ter mentido, porque mentir nunca é certo, entretanto há sim muitas normas conflitantes.
Finalmente, conforme o hierarquismo de Geisler, o capitão da embarcação podia mentir porque mentir às vezes é certo quando há normas mais altas a seguir. Ele justifica a escolha da última alternativa, que a norma de salvar vidas é tem mais valor do que não mentir. Isto torna a ética cristã de Geisler complicada, porque abre precedentes inimagináveis de aplicação da Palavra de Deus.

No sentido prático, o hierarquismo não se diferencia de outras alternativas éticas seculares, somente dos absolutismos tão criticados e combatidos pelo autor. Sua grande questão é resolver o conflito interno e tem um foco essencialmente antropológico.

Em oposição a Geisler está Reifler em sua ética dos dez mandamentos, pois além de afirmar que a ética cristã é absolutista, defende que somente há três alternativas éticas: o antinominismo, o legalismo e o teonomismo. Este último tem o foco no Criador e é a alternativa mais condizente com os princípios cristãos arraigados nas Escrituras Sagradas.


Hans Ulrich Reifler


P.S.: É válido ressaltar que Geisler tem publicado mais de 70 livros e artigos amplamente reconhecidos pela sua erudição de valor teológico, filosófico e apologético. A despeito do que poderíamos chamar de seu deslize no hierarquismo.

Teologia no Tom

O blog mudou de tom. Agora prestará o serviço de expor a teologia cristã. Cansei de política, viva o Reino dos Céus.
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