quinta-feira, 23 de setembro de 2010

TRANSCENDA


Estávamos em cinco, faltava um, naquele momento deveria haver seis. Entre nós, Francisco de Assis, não o santo católico, mas um ser humano que recebera o nome do santo, um físico. O ausente ocasionara questionamentos de modo que evidenciava um problema para o grupo. O grupo reclamou, passamos a relatar todos os problemas, o clima fechou. Passamos a girar e viver em poucos minutos em um possível problema. De Assis falou: “espera, com um telefonema resolvo isto de vez.” O embate direto revolvê-lo-ia, provavelmente. Deu-nos as costas, parecia um leão em câmera lenta em busca do ataque final, a dez passos fez meia-volta e veio a nossa direção. Embora rápido, era perceptível a nós ainda mais lentamente, como no relato das oitentas páginas de Proust acerca do simples movimento de levar uma xícara de café da mesa a boca. Chegou com olhar sereno, levantou a palma das mãos voltadas para nós e à altura dos ombros, disse: “TRANSCENDAM!” Ambos teólogos entenderam a linguagem do físico. Deveriam se colocar soberanos sobre o problema, até ao ponto de desligá-lo, fazê-lo inexistir, podíamos, havíamos criado. A transcendência é uma característica do Criador, ele é onipresente, mas está a parte, separado de sua criação. Como um escritor olha para seu livro, conhece-lhe o conteúdo, está presente, mas está a parte dele, até o abre, toca, mas o escritor não é o livro. Ser transcendente é estar acima das idéias e conhecimentos ordinários, ou seja, comuns. A partir daquele dia aprendi com esta característica metafísica de Deus a transcender todas as dificuldades. No início é difícil, alguns valentes soltam lágrimas, de outro lado, algumas sensíveis donzelas tornam-se guerreiras. Choro e ira podem ser, talvez, inevitáveis, mas não precisamos viver em função deles. Transcender é estar acima dos problemas, é mais que superá-los, é ignorá-los, reconhecer que, como artífices deles, podemos iniciá-los e dar-lhes um fim. Ligamos e desligamos. Se olharmos a terra, caminhando a pés firmes podemos notar as pedras, tropeçar e até cair. Se olharmos sobrevoando, as pedras de tropeço somem e vemos o horizonte, a terra abaixo, o litoral, as nuvens a passar, total calmaria e permanecer com uma visão panorâmica a tudo. Transcender é reconhecer a realidade, os problemas e a vida por outra dimensão. Na dimensão verdadeiramente espiritual.


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