segunda-feira, 29 de julho de 2013

Diga a Ele que muito obrigado

Jesus pregou no Sermão da Montanha: “Tu, porém, ao dares a esmola, ignore a tua mão esquerda o que faz a tua mão direita; para que a tua esmola fique em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.” (Mateus 6:3-4). Lembro bem disso, que não se deve tocar trombeta em por nossas boas obras. O Pr. Ricardo Mateus já ensininava que não importava contar o que se fazia de bom porque se perdia o galardão. Concordo, a palavra do missionário estava em total acordo com os evangelhos. Durante muito tempo, senti vontade de contar algo interessante da vida cristã, mas estes versículos sempre me alertaram. Todavia, resolvi contar, já coloquei diante de Deus que não me importaria de perder o galardão se esta narrativa de um fato real puder abençoar alguém e estimular na prática da justiça, das boas obras. Eram meus anos no seminário, no primeiro ano, na verdade, Ana Lúcia, minha esposa, trabalhava à noite, descia eu duas quadras do Tirol, de onde ficava o seminário e a pegava no cruzamento de Avenida Hermes da Fonseca com a Avenida Bernardo Vieira em Natal, RN. Em 1996, aquele entroncamento era um pouco sombrio, mas animado, barracas de cachorro quente e churrasquinhos disputavam uma vaga em nosso olfato junto à esquina da então fábrica têxtil Guararapes. Salvo engano, havia ali também uma loja de pronta entrega que à noite servia de happy hour para os menos afortunados após à meia noite.
Posteriormente, aquele ponto foi transformado em uma drogaria. Em uma dessas buscas para fazer companhia à minha esposa de sua missão de lecionar no serviço público, ocasionalmente, aquele espaço de idas e vindas, estava deserto. Mas um mendigo dormia no degrau de granito frio na porta da farmácia, aquecia-se colocando as mãos entre as pernas e com um pedaço de papelão curto sobre o dorso. Olhei e meu coração se condoeu. Olhei para Ana e, em sincronia, falamos que muito tínhamos a agradecer a Deus em nossas vidas; era o primeiro ano de seminário, quando os que aspiram ao ministério dividem suas diversas dificuldades. Depois prosseguimos calados, particularmente pensava eu como podia fazer alguma coisa para ajudar aquele mendigo. Ao chegar no quitinete da vila do seminário, Ana me perguntou, “você não quer voltar lá?” e logo respondi: “quero sim.” “Você pode levar um lençol.” O primeiro lençol que lembrei foi o lençol de solteiro que ainda guardava, última lembrança material de minha adolescência. Era um lençol azul claro e estava estampado com diversos ursinhos marrons de palmo e meio, com meu nome pintado à mão livre. Mamãe soube dar-me um nome e minha madrasta, por sua vez, também mãe, soube enfeitá-lo. Dobramos o lençol e saí para descer novamente mais duas quadras pelo lado do, então, Hotel Tirol. Quando cheguei ao mendigo não tive muitas palavras, senti receio de acordá-lo, bati devagarinho no ombro e disse: “Ei, amigo.”, quando ele me olhou, completei: “Jesus te ama e mandou-me te entregar este lençol.” O que mais me impressionou em toda a história, foi a reação do mendigo. Sentou-se, olhou para o lençol com serenidade e olhou para mim com gravidade e disse pausadamente: “Diga a Ele que muito obrigado.” Falou como se Jesus fosse alguém do outro lado da rua, ou vizinho, alguém muito conhecido. Não estava bêbado, deitou-se, cobriu-se com o lençol e voltou a dormir. Saí dali com tanta emoção que meus olhos lacrimejam até hoje quando lembro dessa frase e expressão. Os meses e anos se passaram, aquela drogaria tornou-se uma conveniência e hoje é o Shopping Midway Mall. Sempre que entro pela porta da frente, lembro do mendigo deitado. Sempre que vejo aquela edificação, lembro de como e quem um dia esteve naquele local, lembro novamente do “Diga a Ele que muito obrigado.”. É por isso que gosto de estar ali, mesmo estando sozinho e sem nada para fazer ou com muita coisa para fazer, tanto faz. Acho que perdi meu galardão ao contar a história, não faço questão se ela tiver te tocado e se tornado para te um “Vai tu e faz o mesmo.”

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