sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Entendendo o Mundo Evangélico - Parte III

De quem é a culpa?

Conforme vimos, após a Reforma quatro grandes grupos ortodoxos difundiram-se pelo mundo, no Brasil, até o início do século passado, resumidos entre os luteranos, os presbiterianos, batistas e então os pentecostais. Porém, de quem é a culpa desta azeda salada mista fermentada por heresias e seitas?
Atenção, vou revelar, das editoras evangélicas! Considero a principal, não a única. Até a década de oitenta, todo ano escritores, teólogos ou não, anunciavam as novas heresias e seitas. Livros e mais livros, descrevendo a forma, características de líderes e grupos com pseudo-cristianismo, eram o alerta a todo tempo. Porém, o mercado falou mais alto. A medida que as editoras puderam perceber o crescimento desses, aliada a grande crise de manter uma imprensa evangélica mal paga e mal lida pelos evangélicos ortodoxos, as nossas editoras renderam-se ao mercado pentecostal, em conseqüência no neo-pentecostal, passaram a “polir” o discurso anti-heresia e anti-sectário para cair nas graças do novo investidor de livros. Observem que ainda hoje editoras confessionais têm grandes dificuldades para sua manutenção.
E por que os pentecostais (neo-pentecostais) terminaram comprando mais livros que todos os ortodoxos? Vem aí uma grande questão. A maioria dos líderes ortodoxos, formados pastores e teólogos em cursos confessionais regulares, tinham seus próprios suprimentos em uma intelectualidade e autoridade espiritual adquiridas a partir da igreja e robustecida ainda mais nos seminários e faculdades teológicas. Assim, como pastores que alimentavam o rebanho, davam o provimento espiritual necessário ao rebanho a partir do púlpito de modo que não havia grande necessidade de literatura.
Já quanto aos pentecostais um grande problema, em virtude de sua vanguarda missionária ter em seus quadros uma maioria de semi-analfabetos quando não analfabetos. Lembro-me que somente no final da década de noventa a Assembléia de Deus do Rio Grande do Norte baixou um decreto que para ser pastor, líder de igreja deveria ter pelo menos o primeiro grau, hoje o ensino fundamental.
Estes novos pregadores pouco cultos e os convertidos sob sua guarda, sentiram-se cada vez mais sedentos na busca de conhecimento e buscaram as editoras, que por sua vez tinham livros que lhes traziam, muitas vezes enormes críticas. Houve reclamação e ameaça de boicote, enfim as editoras cederam. Livros e mais livros com listas de seitas e heresias foram retirados do prelo. Escritores mais críticos passaram a ser ignorados. Enfim, entre as décadas de oitenta a noventa as editoras perderam grande oportunidade de catequizar os pentecostais, hoje vê-se que o contrário ocorreu. Observe que somente nesta década a CPAD tomou um grande vulto, não lembro de uma publicadora da Assembléia de Deus antes do ano 2000.
Hoje, este retorno é impossível. As editoras evangélicas continuarão reféns do mundo neo-pentecostal ou irão à falência. Imagine que uma editora publique em um livro de seitas e heresias que aliste uma instituição semelhante à Igreja Universal do Reino de Deus. No outro dia, uma enxurrada de ações judiciais adentrarão às portas da editora e fechá-las-á. Se livros chegarem às prateleiras serão esvaziados, comprados pela própria seita.
Enfim, como em uma produção industrial, os evangélicos estão hoje enlatados na forma gospel televisiva. Para o brasileiro em geral, o evangelho é aquilo, acho também cômico que até igrejas outrora ortodoxas copiem para seus púlpitos os mesmos trejeitos de palco, do palco gospel.
Podemos fazer muito pouco, mas o Espírito de Deus tem feito bastante revelando as pedras de tropeço. Aos poucos, essa pandemia e endemia chega ao seu próprio estresse. Aberrações como a imitação de leões em palco, papas de terra nova, pastores pilões (ou pião?) terminam por evidenciar o que não é um culto racional direcionado pelo Espírito. Creio, tenho fé, que daqui a dez anos as igrejas ortodoxas verdadeiramente evangélicas colherão bastante com este esgarçamento e outros retornarão à igreja católica.  A princípio é necessário imaginar uma futura recepção com discipulado e uma imprensa evangélica que não seja covarde ao mercado. Finalmente, esta é uma análise histórico-teológica particular, aceita-se sugestões e diálogo sobre o assunto. Se ela está certa em seu todo ou em parte, somente o futuro do mundo evangélico dirá. 

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